Ninguém acordou imaginando que haveria uma revolta. Provavelmente tudo teria sido como qualquer dia ordinário se não tivesse chegado aos ouvidos de muitos, ainda antes de entrar na escola, que o portão do pátio havia sido fechado. Como era de se esperar, ao se dirigir até o saguão todos puderem ver uma boa quantidade de alunos ali esperando alguma satisfação, na sua maioria alunos do ensino médio que também cursando o técnico estavam revoltados por não poder levar sua comida até o marmiteiro.
Em meio a algum barulho ali ocasionado, um dos nossos coordenadores, o Sr. Francisco, se posicionou ante um grupo de alunos e disse que iria imediatamente tomar providências para que o portão fosse aberto e demonstrou em bom tom sua própria insatisfação quanto a decisão tomada de última hora e quanto as decisões estarem sendo tomadas sempre assim.
Inflamados pelo ocorrido, um grupo de alunos do terceiro ano iniciou um manifesto silencioso. Usando como arma nossas folhas de caderno, canetas e fita adesiva, foram marcadas frases comparando a escola a uma prisão. Iniciou-se o movimento de colar uma folha de caderno com um número de detento no peito. Em pouco tempo, um número surpreendente de alunos começou a usar o número de detento.
Ao redor desses números, surgiu a ideia, não se sabe ao certo de quem e nem nos cabe buscar saber, de ir protestar no saguão.
Muitas pessoas começaram a se dirigir ao saguão, enquanto outras corriam pelas salas avisando do ocorrido e pregando folhas nas portas nomeado as classes como celas. Em pouco tempo, um contingente enorme de alunos se reuniu de frente a sala dos professores.
Em meio ao barulho e algazarra, alguns alunos tomaram a frente e fizeram com que todos se sentassem. Não houve muito tempo para explicações da parte dos alunos, e nosso coordenador Sr. Francisco começou um conversa. Inicialmente, ele tentou acalmar o movimento e chegar a uma solução pacífica. Ele nos deu a proposta de voltar as salas e esperar o diretor chegar. Nós, unidos ali em frente, resistimos. A nossa conversa era com o diretor.
Por fim, emocionado com demonstrações de apoio da parte de todos nós, o coordenador Francisco se viu sem muito mais o que fazer, e deixou que permanecêssemos ali.
As horas que se seguiram foram confusas.
Muitos foram a frente, muito foi dito por eles, mas a grande massa que ali estava ainda estava muito dispersa e animada. Ali permanecemos por um bom tempo, alguns a frente traçando planos e tirando dúvidas, mas ainda havia muita confusão.
Logo não havia mais ninguém para falar a multidão e iniciou-se um movimento de dispersão por parte de muitos. Enquanto muitos saiam, outros dedicavam cada pedaço de papel que encontravam para construir mensagem, seja citando Cazuza ou System of A Down, sejam frases de apoio ou charges fazendo humor com a demora do diretor para chegar. A entrada se encheu de folhas de papel e cartazes e o som de conversas e muita expectativa pelo momento da chegada do diretor.
Também enquanto isso, foram tentados contatos com jornais e televisão para cobrir o evento, porém infelizmente só houve a chegada de um repórter após o sinal da saída.
Voltando aos acontecimentos, foi colocado o quadro com as notas no meio do saguão e liberada a merenda. Nesse momento, o saguão aos poucos começou a esvaziar. O desânimo e a revolta bateu sobre muitos que estavam a frente. Muitos desanimaram. Muitos disseram que era tudo uma desculpa para se matar aula.
Enquanto a situação no saguão estava preocupante, um grupo de gênios, com humilde modéstia, se reunia na biblioteca para iniciar uma pesquisa nas bases legais que justificasse nosso manifesto. A esses nos referimos como "Os Suíços", pois eles preferem ter seus nomes ocultados e não se envolver diretamente na manifestação, permanecendo "neutros" como a Suíça.
As anotações dos Suiços chegaram as mãos daqueles que estavam a frente, e enquanto todos dispersavam planos foram traçados e conversas-chave aconteceram. Nesse meio da reunião, um aluno ligou para o telefone fornecido pelo próprio diretor e foi atendido por sua esposa de forma grosseira. A informação retirada da conversa rude? Nosso diretor estava em reunião em São Paulo e não poderia comparecer. Ao mesmo tempo, quando questionado, um funcionário de nosso escola disse que o diretor estava em reunião na prefeitura.
Interessante isso, não?
Voltando aos fatos. Após essa informação, seguiu-se a organização e por fim foram chamados de volta aqueles que tinham saído do saguão. Estávamos em menor número do que antes, mas ainda éramos uma multidão.
Foram expostos os fatos a multidão. Foi dito: "Quem está com a gente" e todos disseram sim, e então foi tido que temos que ter postura pra isso. Foi conquistado com muito custo o silêncio entre a multidão, o silêncio que nós precisaremos ter em frente ao diretor. Quando chamamos a frente o nosso veterano que saiu ano passado e havia comparecido pois chegara a seus ouvidos sobre a manifestação, ele foi barrado e levado para fora da escola, na frente da multidão.
Essa cena reforçou tudo o que foi dito sobre o passado, e assim, foi prometida a presença amanhã. Foi combinado que todos nós estaremos lá amanhã, e que entraremos na primeira aula para as 8:00 da manhã subirmos de novo, e se necessário esperarmos todo dia. Foi prometida a postura, foi prometida a educação. Foi prometida a camiseta branca com Fernando Prestes no peito para representar pelo que lutamos.
Por fim, em um sinal de que essa manifestação é pacífica e se faz pelo certo, foi pedido pelos que estavam a frente que se entrasse na última aula, e aqueles com consciência o fizeram. E nos despedimos desse primeiro dia de manifestação com a imagem de todos os ali presentes de braços erguidos, e sobre um coro de "Fernando Ê-O".
Mesmo tendo falado muito, é difícil descrever todos os discursos e todos os momentos fortes do dia. O fato é: as conversas em uma salinha fechada acabaram. É tempo de agir, é tempo de se juntar a essa multidão que é um só Fernando Prestes, O que estamos pedindo não é impossível, é apenas o mínimo de confiança e um pouco de interação nas decisões que influenciam tanto na nossa vida.
Na próxima postagem eu explicarei a todos o que estamos reivindicando.